sexta-feira, janeiro 27, 2006

O que era o
Destacamento do Forte Cameia?

Era um posto avançado da Companhia 2544, que tinha por missão controlar a entrada e saída de nativos da zona de acção da Companhia. Qualquer um que desejasse ausentar-se da zona, deveria ir solicitar ao Comandante do Destacamento um salvo-conduto, para poder circular fora dela. Esse salvo-conduto tinha a data, o nome do nativo e o período em que poderia estar ausente da zona de residência. Findo esse prazo, deveria regressar, devolvendo o salvo-conduto, ou correria o risco de ser interceptado e...


A crueza da guerrilha

Esta foto foi obtida depois de termos apanhado dois indivíduos fora da zona decontrolo. Levados para o Destacamento Militar do Forte Cameia, foram interrogados pelo responsável pelo Destacamento, (o que está no centro da foto) com a intenção de se obterem algumas informações conducentes a outras acções militares, como veio a acontecer.Um dos indivíduos, ao ser interrogado e ao ver a sua situação a complicar-se, decidir dar um valente "sopapo" no comandante do destacamento, atirando-ocontra a parede do edifício que se vê na foto (dormitório do pessoal que comportava 15 homens) e em passo muito acelerado (quer dizer, a correr com os pés a baterem bem no fundo das costas), dirigia-se para porta de armas do referido destacamento, com a intenção de se pôr a milhas do local. Um dos homens da guarnição que estava presente e que fazia guarda num dos postos que construimos, quando o comandante do destacamento lhe disse "está à espera dequê ?". O soldado, virou o cano da G3 e... Foi o primeiro lilaz que a CCaç. 2544 causou ao inimigo. O outro, que estava ainda por interrogar, não lhe interessou seguir o mesmo destino e cooperou. De tal modo que, umas semanas mais tarde, em operação de dois pelotões da nossa Companhia, 3º e 4º onde estavam os Alferes Oliveira e Freitas e os Furrieis, Rocha e Numídio, Alho eAbílio, o transmissões Almerindo, o enfermeiro Martins, bem como o CapitãoTangarrinhas, fizemos um assalto ao acampamento referido pelo interrogado no Forte Cameia. Apanhamos umas coisitas sem grande importância.



Da esquerda para a direita: Enfermeiro Vieira, Furriel Rocha e Transmissões Orlando, falecido há ano e meio

Rodeados por cinco mil residentes

Mas o Destacamento Militar do Forte da Cameia era um local distante do Lumege, cerca de 22 Km, isolado perto do rio Lumege, (paisagem magnifica, pelo perder de vista da "chana" do leste de Angola), e rodeado de cerca de 5.000 residentes. Essa Zona, era um dos locais de abastecimento dos nativos, onde havia um aldeamento "chiesso" e do outro lado do rio Lumege outro aldeamento, o "Jamba", este muito mais "quente", pois recebia as visitas dos combatentes inimigos, da zona do Cassai ! Na minha estadia nesse Destacamento acabei por fazer as guaritas para a guarda, a cozinha e recobrir, com capim novo, as casernas do pessoal e do comando. Os dois que me ladeiam na foto, à esquerda o Enfermeiro Vieira, residente em Sandim Vila Nova de Gaia, (bom moço), sempre disposto a ajudar com penicilina aqueles que se distraíam com as negrinhas e ficavam com o instrumento inchado e inoperacional. O outro, o da direita na foto, o Orlando das Transmissões, era presença sempre activa nas nossas deslocações. Este moço, de um sentidode humor, ímpar, faleceu à cerca de 1 ano e meio, brutalmente atropelado àporta de sua casa em Lordelo Guimarães.

Cerveja à custa do jacaré

Que saudades esse local me deixa... Os jacarés a dormirem ao sol, ao longo do rio, eram um espectáculo. Um deles teve pouca sorte pois a sua pele ainda deu 300 escudos, que foram tranformados em CUCA e NOCAL, para o pessoal doDestacamento. Eu, o do centro da foto, terei sido aquele que mais tempo parmaneceu noDestacamento, (tempos somados, talvez uns 7 meses). Era um local isolado, nem sempre perigoso, mas exigia controlo e atenção e, sobretudo, alguma rigidez de métodos e o não mostrar os dentes aos residentes. Ah, já me esquecia de referir que connosco havia um grupo de milícias, (tropas (?) criadas com nativos para nos ajudarem (?). Eram tão inoperantes, que as balas das armas que possuiam, vim a descobrir, não tinham pólvora !! Utilizavam-na nos canhangulos para caçar! Foi o bom e o bonito. Levaram que contar das mãos deste baixinho, que diziam, quando sabiam que eu voltaria aoDestacamento: "Outra vez o furière Rocha ?? Não pode, ele bate muito".

Voltaremos a estes assuntos noutra altura.Esta descrição já vai longa e pode ser maçadora.Dou a vez a outros.

Um abraço do
Rocha

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